POR RAFAEL VAISMAN
No cenário contemporâneo, a sustentabilidade e a abordagem ESG (Environmental, Social and Governance) emergiram como pilares cruciais da responsabilidade corporativa e social.
No entanto, assim como o dilema “ser ou não ser” em Hamlet, a questão de “ser ou não ser sustentável” se revela igualmente complexa e multifacetada.
Lembro-me de uma ocasião no mês passado, específica durante a 6ª Semana da Sustentabilidade do Shopping Center Norte. No palco, o CEO da Rock in Rio e The Town apresentava minuciosamente as ações e metas relacionadas aos ODS (Objetivos de Desenvolvimento Sustentável) planejadas pela empresa para a execução dos eventos.
O que mais me surpreendeu não foram os números, foi que, em nenhum momento, que eu lembre pelo menos, ele proclamou que seu evento era ESG ou sustentável. Ele narrou metas, objetivos e resultados de forma clara e prática.
Neste artigo, exploraremos a complexidade desses conceitos, trazendo à luz a necessidade de transcender rótulos simplistas, apoiando-nos em evidências, pensadores influentes e dados concretos.
Sustentabilidade: Mais do que Sim ou Não
A sustentabilidade, ao contrário de categorias como “veganismo” ou “vegetarianismo”, não pode ser simplificada em uma etiqueta de “sim” ou “não”.
Ela transcende categorizações estáticas e é uma jornada contínua de práticas e ações que buscam equilibrar as necessidades presentes e futuras.
Como observa o filósofo alemão Hans Jonas, a ética da responsabilidade nos lembra da nossa obrigação de considerar as gerações futuras nas nossas decisões presentes (Jonas, 1984).
A sustentabilidade, portanto, é uma jornada que reflete nossa responsabilidade para com o futuro.
A complexidade do termo “sustentabilidade” é evidente em várias disciplinas. A filosofia nos ensina que essa é uma questão ética profunda, que requer uma consideração cuidadosa das implicações morais das nossas ações presentes sobre o futuro das próximas gerações.
O sociólogo Ulrich Beck também argumenta que a sustentabilidade é uma resposta necessária a uma “sociedade de risco”, na qual os desafios ambientais e sociais se tornam cada vez mais prementes (Beck, 1992).
Reflexões Filosóficas
A filosofia pode nos oferecer uma perspectiva valiosa sobre essa questão. O filósofo existencialista Jean-Paul Sartre argumentou que os seres humanos são “condenados à liberdade,” o que significa que somos responsáveis por nossas escolhas (Sartre, 1946).
Da mesma forma, podemos dizer que somos “condenados à sustentabilidade” – a responsabilidade de tomar medidas sustentáveis recai sobre nós, mas a jornada é contínua e complexa.
O Risco de Banalização
Há um risco real de que o termo “sustentabilidade” se torne banalizado e perca a sua força comunicativa. Quando tudo e todos se autodenominam “sustentáveis”, os consumidores podem ficar céticos quanto ao real compromisso das entidades e indivíduos.
A superficialidade das alegações de sustentabilidade pode prejudicar a confiança nas iniciativas legítimas.
Para evitar esse fosso entre retórica e ação, devemos olhar além das etiquetas e avaliar as ações e práticas reais que sustentam a alegação de sustentabilidade.
ESG: As Três Letrinhas Mágicas do Mercado Financeiro
O termo ESG – que engloba critérios ambientais, sociais e de governança – tornou-se um farol no mercado financeiro. Grandes players, como investidores institucionais e gestores de ativos, agora consideram o nível de ESG das empresas em suas decisões de investimento.
Empresas comprometidas com práticas sustentáveis têm atraído capital significativo, impulsionando uma corrida global em direção à integração do ESG nos negócios.
Segundo dados do Global Sustainable Investment Alliance, até 2020, mais de US$ 35 trilhões em ativos estavam sob gestão com foco em critérios ESG (GSIA, 2020).
Necessidade de Focar nas Ações Concretas
Assim como com a sustentabilidade, a avaliação do ESG deve transcender o rótulo “ser ou não ser”. Mais importante do que afirmar que uma empresa ou evento é “ESG” é entender quais ações são tomadas, por quem, onde e qual o impacto real delas.
Empresas que divulgam apenas suas intenções sem ações concretas arriscam comprometer a credibilidade do movimento ESG. Como apontado pelo sociólogo Ulrich Beck, estamos vivendo em uma “sociedade de risco” (Beck, 1992)
Isso significa que a sustentabilidade e o ESG não são mais meras opções, mas necessidades imperativas em um mundo marcado por desafios ambientais e sociais.
A Importância da Comunicação Responsável e o Caminho para a Sustentabilidade
À medida que mais eventos e empresas se comprometem e lideram iniciativas nessas esferas de sustentabilidade e responsabilidade, é natural surgir um aumento nas perguntas e na busca por transparência.
No entanto, é imperativo lembrar que a busca pela verdadeira sustentabilidade demanda mais do que simples palavras e promessas.
Ela requer investimento de tempo, esforço e recursos, bem como a colaboração de equipes multidisciplinares e profissionais com conhecimento especializado nessa área.
Nesse contexto, a comunicação desempenha um papel crucial na construção de uma sociedade mais sustentável. As empresas, eventos e indivíduos que abraçam essa jornada devem comunicar suas ações sustentáveis de maneira transparente, quantificável e mensurável.
Em vez de recorrer a manchetes sensacionalistas, é essencial fornecer informações detalhadas sobre as ações empreendidas e seus reais impactos.
Aprofundar a comunicação sobre práticas sustentáveis não apenas fortalece a conexão entre empresas e consumidores, mas também promove uma compreensão mais clara do compromisso genuíno com a sustentabilidade.
É através dessa comunicação responsável que a sociedade pode discernir entre retórica vazia e ações concretas, fortalecendo, assim, o caminho em direção a um futuro mais sustentável e justo para todos.
Conclusão: Protegendo a Integridade dos Conceitos
Em última análise, a sustentabilidade e a abordagem ESG (Environmental, Social and Governance) representam não apenas conceitos, mas a base sólida sobre a qual construímos um futuro melhor. No entanto, essa construção vai além de meros rótulos e slogans.
É uma jornada contínua, uma busca incessante por práticas e ações que reflitam nossa responsabilidade para com o mundo presente e as gerações futuras.
É compreensível que, muitas vezes, as conversas sobre sustentabilidade e ESG se reduzam ao binário simplista de “ser ou não ser”.
No entanto, essa abordagem não apenas empobrece a complexidade desses conceitos, mas também ameaça sua integridade.
Devemos resistir à tentação de categorizar tudo de forma superficial e abraçar uma visão mais aprofundada, uma que avalie as ações e o impacto real por trás das palavras.
Próximos Passos e Reflexões
Nos próximos artigos, poderemos aprofundar nosso entendimento de temas muitas vezes complexos e controversos.
Exploraremos tópicos como crédito de carbono, o poder do plantio de árvores, a importância da premiação de stands regidos por métricas sérias e auditáveis, e o significado por trás dos selos e certificados. Você pode estar se perguntando: “Por onde começar e em quem confiar?”
Referências:
Jonas, H. (1984). The imperative of responsibility: In search of an ethics for the technological age. The University of Chicago Press.
Beck, U. (1992). Risk society: Towards a new modernity. Sage Publications.
JEAN-PAUL SARTRE. O EXISTENCIALISMO É UM HUMANISMO. CONFERÊNCIA PRONUNCIADA NO CLUB MAINTENANT EM 1946) IN: SARTRE. Trad . de Vergílio Ferreira. S. Paulo: Abril, 1978, p.3-32. (Coleção Os Pensadores)
Global Sustainable Investment Alliance. (2020). Global Sustainable Investment Review 2020. https://www.gsi-alliance.org/wp-content/uploads/2020/09/GSIR_Review2020.3.pdf
Raworth, K. (2017). Doughnut economics: Seven ways to think like a 21st-century economist. Chelsea Green Publishing.
Elkington, J. (1997). Cannibals with Forks: The Triple Bottom Line of 21st Century Business. New Society Publishers.
*Rafael Vaisman é CEO da We Stand e especialista global em sustentabilidade e inovação com mais de uma década de experiência em eventos.