Qual é o probleme?

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POR RONALDO BIAS FERREIRA JR.

Sejam bem-vindes à linguagem inclusiva que fala com todxs. Será?

Quando falamos de temas relacionados à diversidade, equidade e inclusão, percebemos que hoje há uma audiência obcecada pelos detalhes.

Às vezes no limite mesmo da patrulha. Simples atitudes ou ações do dia a dia, no mundo real ou na selva digital das redes sociais, podem dar origem às reações (legítimas em grande parte) de ativismo.

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As palavras que usamos são alvos constantes da militância atenta e engajada de diferentes matizes ideológicas. Algumas palavras são consideradas machistas, outras homofóbicas, e assim por diante.

Isso provocou a atitude benéfica de medirmos melhor nossas palavras. Quais falar, quais evitar. Não é autocensura, é o cuidado devido para nos manifestarmos de acordo com nossas crenças e valores, sem ofender pessoas e grupos que merecem nosso respeito.

As línguas são vivas. Estão em constante transformação e evolução. Mesmo os dicionários, que registram as palavras correntes, precisam renovar-se de tempos em tempos. A linguagem coloquial, no nosso caso o português falado, é como nos comunicamos em situações informais.

Alguns especialistas afirmam que a grande riqueza da língua falada está na intercompreensão real entre as pessoas. Já a língua tradicional ou escrita, como documento, resume e formaliza a realidade, correndo o risco de ser menos veraz.

Alguns dias atrás, numa boa roda de conversa sobre inclusão, discutimos se a frase DIA DE BRANCO era racista. A origem da expressão é incerta. Alguns dizem que nasceu na Marinha, por conta dos uniformes de cor branca, outros remetem aos ternos de linho branco, que muitas pessoas usavam.

Fato é que quando ouço essa expressão e ressignifico para os dias de hoje, entendo como sinônimo de “dia de trabalhar”. Ou seja, mesmo que a origem não seja racista, o entendimento comum contrapõe o “branco que vai trabalhar” ao “preto que não trabalha”, tornando “dia de branco” um termo inadequado.

Soa de fato racista, assim como “serviço de preto”, usado como sinônimo de “serviço malfeito”. Há uma lista de expressões ainda correntes que foram naturalizadas ao longo do tempo, que representam, de fato ou simbolicamente, preconceito. “Judiação”; “tuas negas”; “pé na cozinha’; “inveja branca”. Todas essas estão no mesmo balaio.

Ainda que a expressão tenha tido uma origem diferente, não racista e sem a intenção de ser, ela é entendida como tal, e, portanto, classificada comoracista.

Afirmo isso mesmo não sendo meu lugar de fala, mas sim o meu lugar de escuta. Não é como eu me sinto em relação a essa frase, mas como as pessoas negras, gays, judias ou outros protagonistas da diversidade se sentem quando a pronunciamos.

A partir disso, meu sentimento deve ser a empatia com a causa, reescrevendo a frase ou não a utilizando mais. Até mesmo porque não será nenhum sacrifício falar “dia de trabalho”, “serviço malfeito”, “maltrato”.

Se o desejo for expressar o seu respeito às pessoas que se sentem excluídas, é melhor reeducar-se e evitar esse tipo de expressão.

Quando nos comunicamos pela internet é comum usarmos abreviações como ‘pq’, ‘vc’, ‘tbm’, ‘rsrsrs’, entre outras. Um jeito informal de falar que não aprendemos na escola, mas que é facilmente entendido.

Atualmente o emoji clown face (cara de palhaço) está super popular nas redes sociais. Ele é usado para qualificarmos situações que nos fazem parecer palhaços. Fenômenos assim também são frutos da evolução social de uma língua.

Sempre buscamos atalhos ou ajustes para tornar a comunicação mais rápida. Um emoji nada mais é do que uma palavra codificada, uma ideia compartilhada. O valor da ideia vai variar entre os diversos receptores.

Pessoas mais novas tendem a ter menor dificuldade, as mais velhas estranham mais. Porém, as evoluções a partir de emojis não costumam gerar tanta polêmica quanto à adoção da linguagem neutra ou não binária.

A linguagem inclusiva não é obrigação imposta, mas uma discussão que se propõe a incluir pessoas trans não binárias, intersexo e as que não se identificam com os gêneros feminino e masculino. E não é só isso.

A linguagem neutra fala sobre relações de poder. Sobre tornar visível uma parcela da sociedade que é sempre posta à margem. Não é uma simples mudança ortográfica, mas uma mudança de perspectiva.

Sem grande esforço, é possível deixar a linguagem mais inclusiva, sem sacrificar o português formal. Podemos trocar bem-vindos por boas-vindas, usar mais o termo “pessoas” para não masculinizar a comunicação, trocar diretores por diretoria, senadores por senado, evitar a palavra “homem” no sentido de humanidade, ou simplesmente usar aluno e aluna, médico e médica, senhoras e senhores.

Cuidados desse tipo criam pontes para a sensibilização positiva de outras pessoas e nos mantêm alinhados com quem já está praticando a inclusão no discurso.

Sabemos que não é fácil sair da nossa zona de conforto, inclusive as ortográficas, mas esse é um exercício que também modifica um padrão de pensamento ultrapassado.

Sua prática consolida a transformação e mudança que precisamos promover. Até mesmo porque refletir sobre a linguagem não nos impede de agir a respeito de outras questões.

O mundo nos pede generosidade e empatia, por isso a linguagem inclusiva não é questão de aceitar ou não. É questão de entender.

*Ronaldo Bias Ferreira Jr. é sócio-diretor da um.a Diversidade Criativa, conselheiro da AMPRO e fundador do programa de capacitação MDI Mestre Diversidade Inclusiva, em parceria com a Pearson Educacional